terça-feira, 3 de junho de 2014

Os comerciais de TV: 30 segundos endereçados a você!

     Nos estudos da disciplina Mídias e Educação dialogamos a cada encontro com autores que abordam as relações da mídia com a educação, sociedade do consumo e etc.

     Rosa Fischer, uma das autoras estudadas - e mencionada em posts anteriores - nos faz pensar sobre o quanto a mídia, através dos programas de televisão, atravessa nossas formas de pensar e agir (subjetividades) por meio de diferentes estratégias de “endereçamento”.

     Estas estratégias buscam comunicar (endereçar, destinar) algo a alguém, mas pensando nesses alguéns como sujeitos que se identificarão com o que assistirem se enxergarem um pouco de si no que está sendo apresentado. Dessa forma a programação poderá “prender” o olhar atento destas pessoas.

     Com os comerciais de TV não é diferente. Entre uma programação e outra assistimos propagandas de publicitários que tentam vender determinado produto de uma empresa, aliando imagem, som e texto de diferentes formas a públicos específicos.

     Algumas propagandas acabam ficando em nossa memória, não é mesmo? Quem não se lembra das propagandas dos ursos polares no período de Natal da famosa “Coca-Cola? Ou então dos siris de uma propaganda da cerveja Brahma, com o jargão “na-na-na-ná”. E quando os publicitários usam uma música, um jingle, que cantamos juntinho a cada aparição da tal propaganda? Não sai da nossa cabeça!

     Fischer (2003) propõe um roteiro de perguntas para subsidiar um estudo sobre programas de TV, propagandas e outros artefatos culturais específicos. Vamos colocar em prática com as duas propagandas de creme dental abaixo:


                                                       propaganda Colgate Total 12

                                                  propaganda Sensodyne Repair & Protect

      Quais os objetivos desse artefato? A quem “se endereça”?

Já sabemos que o artefato é uma propaganda, então a partir disso podemos apontar o objetivo, que é vender um produto, uma ideia. Mais especificamente, convencer o público a comprar os determinados cremes dentais apresentados nas propagandas.

Pela forma como é construída e pelo produto que é vendido, entendemos que as propagandas se endereçam desde adolescentes a idosos, que compram seus cremes dentais com critérios próprios de escolha, atentando para o preço, é claro, mas também aos conhecimentos adquiridos sobre cuidados bucais. Afinal, quem paga aproximadamente R$ 10,00 por um creme dental de certo é por indicação, experiência, ou pela propaganda veiculada na mídia.

      Afinal, de que trata esse programa? Quem fala e de que lugar?

As duas propagandas tratam de recomendações acerca de cuidados com a dentição a partir da indicação de um produto para isso. Na primeira, pessoas de uma família perguntam a um dentista, que também faz parte da família, que creme dental ele indica para determinados problemas bucais. Ele responde todas as vezes “Colgate Total 12”. Já na segunda propaganda, outro dentista fala, como se estivesse respondendo a questão de uma entrevista, sobre os benefícios do uso do creme dental Sensodyne, que é o indicado por ele.

 As pessoas que falam nos dois comerciais são dentistas, e neste contexto de venda de creme dental sabemos que eles são as vozes autorizadas para fazer um discurso sobre o que é melhor para a saúde bucal. Além disso, para legitimar mais ainda as indicações dos dentistas, é mostrado abaixo de seus nomes, no início de cada propaganda, o CDO, para comprovar a quem quiser se informar que são de fato dentistas, com registro.

As estratégias também aparecem nas frases que servem de slogans das marcas. No comercial da Colgate: “A marca número 1 em recomendação dos dentistas”. No comercial da Sensodyne: “9 entre 10 dentistas recomendam Sensodyne para dentes sensíveis”.

Nos dois comerciais os dentistas falam num consultório dentário, usando seus jalecos, dando força ao discurso. As duas propagandas tentam mostrar que os profissionais realmente acreditam que o creme dental que apresentam é o mais indicado para os cuidados com a dentição.

                     Com que linguagens se faz este produto?

Na propaganda da Colgate podemos perceber as linguagens oral, escrita (predominância da oral), gráfica, digital, sonora e musical. A música de fundo que permanece em todo tempo da propaganda passa uma sensação de conforto e descontração, reafirmados nos sorrisos e risadas dos atores.

A forma como os atores estão dispostos também passa uma sensação de conforto e familiaridade entre eles, como uma “família”, que o comercial visa representar, mas não perdendo a característica de um consultório.
Na maioria do tempo a cena é desenvolvida num mesmo local, tendo dois recortes, um para ilustrar doze cremes dentais (doze benefícios) formando um só, o Colgate Total 12, e ao final para mostrar a imagem e slogan temas da marca.

No comercial da marca Sensodyne é utilizado as linguagens oral, escrita (linguagem escrita bastante presente), gráfica e digital.

Diferente da primeira propaganda, não há música de fundo e sonorização, passando a impressão de que a situação é de entrevista, mas com uma filmagem mais simples, mais “caseira”. Os recursos gráficos e digitais são mais explorados num momento, pois ilustram a ação do creme dental nas áreas sensíveis, para que o telespectador possa compreender, ou melhor, ver, como se dá ação do produto.

     Que relações fazer entre esse artefato da mídia e outros      problemas, teorias ou temáticas de interesse para a educação?

Quando passamos a olhar de forma crítica para o ensino e para as infâncias contemporâneas percebemos que a escola é apenas uma das muitas instâncias sociais que educam. Antes sabíamos da escola e da família, hoje, podemos afirmar que a mídia também tem educado e formado os sujeitos.

A TV, mais que um eletrodoméstico, é uma instância educativa da qual a escola precisa estar atenta. Como educadores não podemos ficar alheios aos programas que nossos alunos assistem, ao que está grade de horários das emissoras, fazendo relações com questões atuais da sociedade, e porque não com os conteúdos do currículo?

As duas propagandas analisadas tem estrita relação com as aprendizagens escolares, pois abordam a saúde bucal, que estudamos nas noções sobre o corpo humano. O cuidado de si é algo inevitável aos seres humanos, e as escolhas dos produtos de higiene fazem parte do cotidiano das famílias, por esta razão, propagandas como estas influenciam as escolhas das famílias nos mercados, armazéns e farmácias.

Podemos problematizar com os alunos o preço destes produtos, comparando-os com outros da mesma marca, pois estes são mais caros que os cremes dentais comuns, por esta razão, muitas vezes não fazendo parte dos lares menos abastados. Podemos discutir sobre os profissionais que estão falando na propaganda, sobre a razão pela qual os comerciais de creme dental costumam envolver dentistas; Outras marcas como Close-up, Sorriso e Oral-B também apresentam propagandas de caráter mais “científico” como estas? Pode ser outra análise feita com os alunos, pois algumas propagandas da Close-up e Sorriso abordam mais o “frescor”, o “hálito”, com um contexto menos “enrijecido”, do que questões mais aprofundadas da saúde bucal.

A partir de uma introdução mais simples como esta, podemos trabalhar com os alunos a discriminação das estratégias de endereçamento, adequando ao nível da turma para discussões, abordando as linguagens com as quais a TV opera.


Por fim, fique com as palavras de Rosa Fischer a respeito do trabalho do educador com a mídia como instância cultural e a TV como reprodutora da mídia:

“O trabalho pedagógico insere-se justamente aí, na tarefa de discriminação, que inclui desde uma franca abertura à fruição (no caso, de programas de TV, comerciais, criações em vídeo, filmes veiculados pela TV e etc.) até um trabalho detalhado e generoso sobre a construção de linguagem em questão e sobre a ampla gama de informações reunidas nesses produtos, sem falar nas emoções e sentimentos que cada uma das narrativas suscita no espectador (FISCHER, 2003, p. 27).”

Késia Corrêa e Carolina Cardoso


REFERÊNCIA:

FISCHER, Rosa Maria Bueno. Televisão & educação: fruir e pensar a TV. 2.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.


Uma conversa sobre a mídia como instância cultural...




Com base nos estudos de Rosa Fischer (2003) buscaremos trazer reflexões sobre as produções midiáticas entendidas como artefatos culturais.

Ao falarmos das produções midiáticas, primeiramente precisamos compreender que não podemos desconsiderar a forte presença da TV na vida das pessoas. Quem, por menores condições financeiras que tenha, não possui um televisor em casa? E olha que estamos falando apenas de um... ou seja, a mídia, através da televisão, está presente em nosso cotidiano.

Fischer alerta que pensar a relação entre mídia e educação como algo maior, exige não somente uma leitura crítica de mundo, mas o reconhecimento da importância do tema como algo social e político.

Falar da mídia e suas produções também implica pensar que tempo é esse que vivemos e sobre as práticas que produzimos e nos produzem. Para entender este tempo, precisamos, num segundo momento, perceber a existência de diferentes espaços que educam além da família e da escola (instâncias culturais legitimadas em seu caráter educador), já que a mídia não se limita a informar e entreter tão somente, hoje ela é reconhecida como mais uma instância educativa.

A proposta da autora é que possamos problematizar em sala de aula como são estabelecidas as relações das produções da mídia e os diversos públicos atraídos por ela ao consumo de produtos e ideias.

A mídia, na “telinha”, opera com uma linguagem específica, e visa através de suas programações retratar os tecidos sociais, intervir neles, estudá-los, para conhecer os públicos aos quais suas programações, seus produtos, suas ideias, se destinam. Com base nesse pressuposto, já sabemos por que nos identificamos com uma novela, uma propaganda, um programa de entretenimento que trata de “assuntos da vida”. Nós completamos e significamos o que é mostrado na “telinha”, nós completamos as imagens. Assim, nossas subjetividades vão sendo formadas nesta trama entre vida real e vida na TV, que por vezes ofusca a vida real. Esta forma de viver e “ver” a vida incide na constituição dos sujeitos contemporâneos. Aqui, não estamos fazendo uma crítica negativa à mídia, mas analisando-a como instância cultural.

Por isso precisamos estudar as diferentes estratégias de endereçamento (imagem, som, criação) e compreender suas significações, pois os modos de endereçamento não são “neutros”, tem uma finalidade, um público-alvo. Por isso estas estratégias, ao serem investigadas, se tornam educativas e pedagógicas.

Em suma, pensar na educação da sociedade contemporânea exige um olhar atento para a forma pela qual as linguagens da TV são construídas, possibilitando organizar um trabalho pedagógico que leve os sujeitos a refletirem sobre o consumo midiático, característica do tempo que vivemos.

Então, como pensar em um trabalho pedagógico que envolva a linguagem audiovisual?

Mais do que criticar, precisamos avançar e pensar em um trabalho que utilize as mídias como recurso e estratégia, e conhecer quais as formas de acesso e como os alunos se apropriam das mídias, como foi comentado no post anterior.

Partindo deste pressuposto você poderá discutir com os alunos sobre programas de TV, novelas, filmes (artefatos culturais), promovendo um debate sobre consumismo e outras temáticas atuais associadas à forma que nos relacionamos com a mídia.

Um exemplo de atividade é trazer filmes ou documentários como “A história das coisas”, e promover debates, pesquisas e produções textuais em diferentes gêneros e aportes, com uma reflexão crítica sobre consumo. Assim como outros artefatos culturais podem ser explorados com os alunos, conduzindo a discussão aos valores, compreensão de sujeito que são trabalhados e outras questões que o material permitir.



REFERÊNCIA:

FISCHER, Rosa Maria Bueno. Televisão & educação: fruir e pensar a TV. 2.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.